"A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria". Paulo Freire

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

OS TEXTOS E O CONTEXTO

“Sou passarinho eu sou, ô!
Eu vou cantando, vou, ô!
Vou procurando um raminho
Bem sequinho, pra fazer bem gostozinho
O nosso ninho de amor!”.
(“Ninho de Amor”. - Zé Vicente)

Se você quiser saber como foi o terceiro módulo de formação da Rede de Educação Cidadã no Ceará, RECID-CE seguem aqui três dicas. a) prepare o seu coração para o amor. Amor, neste caso, é a vida radicalmente em primeiro lugar!; b) conheça o projeto “Sertão Vivo” na fazenda Aroeira, vizinha a Vila Guassussê, no município de Orós, no Centro Sul cearense; c) escute com os ouvidos do coração da alma a música “Ninho de Amor” de autoria do Poeta, compositor e intérprete cearense, Zé Vicente. Foi essa música que deu o tom de nosso encontro, cujo tema, “A Mística e a Militância na Educação Popular”, sob o tom de um Sol Maior, embalou-nos na Rede e no ritmo da educação cheia de esperança. Foi neste embalo que nós tiramos do papel o décimo segundo principio do Projeto Político Pedagógico da Rede de Educação Cidadã – o PPP da RECID – vivenciando, sentindo e pertencendo. Vivenciamos uma integração de nível superior com a natureza. Fomos realmente um. As árvores – Aroeiras, Juazeiros, Tamarineiros, Jucás, Cajaranas, etc. – nos deram o aconchego de suas sombras. Foram o palco dos artistas do sertão. Os passarinhos. – Rolinha fogo pago, Bem-te-vis, pintassilgo, azulão, sabiás e tantos outros que eu há anos não os via, alguns eu nem os conheci, misturavam-se no coro com Zé Vicente e João do Crato. E nós, claro! As noites nos traziam de presente o esperado, cantado e místico “Vento do Aracati”. A coreografia das árvores, sob a luz e um céu estrelado e por metade da noite a luz da deusa das noites sertanejas. A lua sempre linda, sempre mística, sempre saudade. A mulher mais amada do sistema solar.
Três textos ajudaram-nos na reflexão e no diálogo com o contexto. Ajudaram aqui é um termo apropriado, pois as experiências individuais e coletivas, os sonhos, a sintonia e a maturidade da equipe da RECID-CE, deixam tudo mais fácil. Há, hoje, ainda, e isto foi para nós, significativo, o mais importante, porque tocou a todas (os), poder aprender da experiência do “Sertão Vivo”. Conceitos que temos discutido na RECID como ideal, no “Sertão Vivo” é realidade. Autonomia lá não é e não se parece com patologia. É sinônimo e decorrência da descentralização. Esta é visível e concreta. Planejamento não é apenas adjetivado de participativo. Ninguém diz, mas qualquer um ver. A avaliação não é tribunal de julgamento e lugar onde uns são acusados e outros acusadores. É parte esperada e permanente de um processo maior. E tudo isto não seria possível sem uma gestão coletiva, democrática e transparente que nem faz questão de ter por sobrenome, compartilhada. Vivemos momentos de extrema grandeza para a RECID-CE que encontrou referenciais éticos e testemunhos eloquentes para confirmar sua trajetória em busca de uma educação libertadora. A Memória de que fala a diretriz quatro do princípio doze do PPP é algo celebrado na liturgia da vida. É significativo e providencial encerrar este processo formativo deste ano da RECID-CE no “Sertão Vivo”. Pois nada pode “Ser Tão Vivo” e tão pedagogicamente exemplar para este momento de perdas, de dúvidas, incertezas e de instabilidades que vive a RECID em âmbito nacional que aprender com o “Sertão Vivo”. Ouso dizer, com a RECID-CE, que sabe enfrentar as dificuldades e, “celebrar e contemplar a vida e a luta, com seus limites, avanços e aprendizados”, (PPP, 12, 5) partilhando as conquistas coletivamente.
Sonho e desejo que a RECID-NE, a exemplo da RECID-CE, se permita vivenciar o que vivenciamos nestes quatro dias na família “Sertão Vivo. Neste tempo de exigências e nesta mudança de época, muitos são os que não têm rumo. Não têm referências, e já não sabem aprender com os passarinhos, com as árvores, com o vento e com as pedras. Por isto já não aprendem com o seu semelhante, pois não o reconhecem como seu parceiro na pronúncia do mundo. Pude, nestes quatro dias de grande afetividade, além de dá um jejum na saudade, confirmar uma antiga convicção. Vivemos neste momento histórico e cheio de incertezas e desafios, uma crise em dupla dimensão. Primeiro uma crise das e nas instituições. Tenho dito que não concebo vida humana e humanizada sem instituições. São elas que dão apoio, sustentação e sentido à vida humana em sociedade. Segundo e que decorre da primeira, vivemos uma crise sem precedentes de lideranças. Eu também não concebo libertação, utopia e salvação possíveis sem líderes. Estes devem ser democráticas, humanas e humildes. Devem ser capazes de elogiar para que sua crítica tão necessária tenha valor pedagógico e reconciliador. Assim são as lideranças do Sertão Vivo e da RECID-CE. Os textos continuam importantes, mas devem brotar e dialogar com os contexto. São estes valores que vi e testemunho na RECID-CE e no “Sertão Vivo”. Ouso dizer que aprendemos todos. Porque, na concepção freireana de educação, e é ela que nos orienta nesta caminhada, quem ensina, se realmente ensina, ao ensinar aprende. E quem aprende, se realmente aprende, ao aprender, ensina. Isto parece-me ter sido a realidade deste terceiro módulo. Uma troca de saberes, de sabores e experiências. No entanto, e isto é importante ressaltar, o nosso encontro, mesmo sendo no “Sertão Vivo”, só foi este momento de prazer e de aprendizado porque é conseqüência de uma vivência cotidiana. Da RECID-CE e do “Sertão Vivo”. Agradeço a Deus e aos companheiros e companheiras que viveram comigo estes momentos mágicos. Encerro recorrendo ao PPP mais uma vez. No seu princípio doze, na sua diretriz três, nos convida a “construir e cultivar relações de amorosidade, na escuta e no diálogo atentos e capazes de perceber e respeitar a riqueza da diversidade das manifestações culturais e religiosas”. Esta diretriz parece-me resumir o que foi nosso encontro e o que é nossa realidade.

Curitiba, 07 de Dezembro de 2011.

João Santiago. Juntamente com Zé Vicente contribuiu nas reflexões e na execução do encontro da RECID-CE no Sertão Vivo nos dias 02, 03 e 04 de Dezembro. Participou também da reunião do coletivo da RECID-CE no dia 01 de Dezembro.