"A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria". Paulo Freire

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

TODOS ESTAMOS SURDOS?

São muitas as manifestações e variadas as formas de se manifestar, e já é razoavelmente grande o barulho causado, mas ainda são poucos os que o escutam. São muito poucos os que de fato ficam indignados e ninguém até aqui agiu de verdade. Tenho, talvez como todas (os) vocês, recebido inúmeros recados falando das iniqüidades do big brother brazil, especialmente o “dose”. É realmente uma dose. Porém, se tudo o que se diz, é realmente assim, é preciso fazer alguma coisa. Estamos sendo molestados por um terremoto muito mais devastador que o do Haiti ou o do Japão. Pois o nosso é moral. Atenta contra a dignidade humana e é ideologicamente pensado e articulado. É friamente calculado para atingir um alvo que, certamente não deve ser os oito ou dez milhões de Reais que rendem à famigerada emissora de TV que o transmite. Mas entre nós muitos pensam assim. Recebi, portanto, em forma de cordel, de crônicas, de artigos e de orações desesperadas, várias manifestações. Estou com minhas veias intoxicadas de tanta confusão conceitual e omissões, às vezes até aparentemente convenientes. Mas sempre com um grau de desespero e resignação flagrantes. Os conceitos de cultura, de religião, de trabalhador, de artistas, de heróis, de jornalismo, de ser humano, de homem e de mulher, entre outros, estão um “big brother brazil bial”, só. Se as crianças que o assistem aprenderem assim, assim será. E tem aqueles que dizem: mas as crianças não assistem o bbbb-dose! “Fai finta” diriam os italianos.

Estou em ebulição, entre este e outros motivos porque, li na semana passada que, parte da população da “Rocinha” no Rio de Janeiro, avaliou injusta a prisão do traficante “NEM”, pois segundo eles, ele “é um bom administrador”. Fiquei pensando em quantos prefeitos nos 5565 municípios brasileiros merecem esta avaliação. Mas muitas são as perguntas que fervilham dentro de minhas idéias. Decidi compartilhá-las com vocês com duas intenções: a primeira é realmente contribuir com a discussão neste momento. Ou seremos capazes de debater, fazendo-nos novas perguntas, iniciando um diálogo franco e aberto, o que nos exigirá atingir a indignação, ou, do contrário, ficaremos na resignação; a segunda é externar algumas das perguntas que me têm deixado inquieto. Dizer isto, para mim, é terapêutico. Em seguida formularei estas perguntas.

Começo nos perguntando o que iniciando um die debater, fazendo-nos perguntass.a passada que parte d apopula significa ser a televisão brasileira uma concessão pública? Não existe uma ética comportamental, que esteja acima, bem acima de qualquer tipo de censura, mas que proteja a sociedade dessas patologias morais? Qual deve ser a postura de uma instituição de ensino que forma um jornalista que usa de sua profissão para fazer terror contra a coletividade? Sabemos que o “bbbb-dose” é o pior, mas não é o único. Quando um seqüestrador resiste aos apelos da policia e não quer se entregar, ameaçando a integridade física e a vida do refém, normalmente apelam para sua mãe. Não seria o caso? Estamos com a integridade moral da nação em risco. Este apresentador, de passado tão brilhante, devemos reconhecer, deve ter uma religião. Qual é a religião dele e qual deve ser a postura desta religião diante de um desvio moral e de conduta? Tudo isto que ele faz e propicia, permite e instiga que seja feito, está nos princípios de sua religião? É hora de ousar!

A questão é ecológica, já que em nosso tempo é mais fácil emplacar uma luta por direitos animais que por direitos humanos, apesar de que eles não devem ser contraditórios. A proposta do big brother brazil bial “dose” é ser um zoológico bem animado. Pergunto: cadê a sociedade protetora dos animais? Não seria o caso de entrar com um pedido em nome dos animais? São seres incapazes de tal brutalidade contra seus semelhantes ou contra quem quer que seja. As instituições de defesa da criança e do adolescente, nacionais e internacionais, o que podem fazer? Nada? Será que não sabem ou não escutam? Os organismos de defesa dos Direitos Humanos, nacionais e internacionais, enfim, estão de acordo, ou a causa não é tão desumana assim? Afinal de contas, não morreu ninguém ainda, não é? As entidades de homossexuais, não se sentem agredidas em sua dignidade? Afinal, são normalmente instituições e pessoas comprometidas com os Direitos Humanos, abominam a canalhice e a depravação moral. Sabem o quanto pesa uma injustiça. Pelo menos as que eu conheço são assim. Sabem escutar, e têm como característica a coragem e a vontade profética de ver, antes de tudo, o ser humano. A vida.

Vivemos momentos de grande contradição. Quanto mais dispomos de recursos humanos, tecnológicos e objetivos de acabar com as fomes, sejam elas de alimento, de educação, de cultura e de justiça, mais nos distanciamos desta conquista. O governo do maior Estado da federação, por exemplo, também imita o “bbbb-dose” ao colocar a policia armada e poderosa, contra pessoas desnutridas e desfiguradas pelo “bbb dose” do crack. Seres cadavéricos andantes que agora provocam a indignação do mundo, conforme mostram alguns meios de comunicação. Talvez porque não sejam “heróis”, “guerreiros”, “modelos” já que enfeiam a cidade as telas de alguns poucos jornais que ousam mostrá-los. Este é um ano eleitoral e por isto mesmo um ano propício para fazer a pergunta mais revolucionaria que já fomos capazes de formular. Por quê?

Ainda neste campo seguem as perguntas: e as instituições que guardam a imprensa e as comunicações, a Associação Brasileira de Imprensa – ABI -, por exemplo, nada pode fazer? Será que não se envergonham disto? A Ordem dos Advogados do Brasil – OAB – com tantos e significativos serviços prestados à democratização e aos Direitos Humanos deste país, inclusive à imprensa, como poderia nos ajudar? Qual deve ser o seu papel numa hora de decadência como esta? Ainda a pouco falei de religião, e a Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB – sem a qual não saberíamos dizer o que seria deste país, vai ficar calada, ou a gente é que está surdo? A CNBB sempre assumiu uma posição profética e corajosa quando a vida esteve ameaçada. O que tem a dizer ao povo católico e Cristão brasileiro a CNBB? Ou isto não tem nada que ver com profecia?

Os trabalhadores e as trabalhadoras brasileiros, todos nós o que pensamos disto tudo? Vamos aderir mesmo que como omissão a este “árduo” “caminho” de se fazer “heróis?” vamos ficar calados (as)? Até quando? O que você fala para seu filho e para sua filha, para seu aluno e para sua aluna, para seus amigos, enfim, sobre esta iniqüidade contra a vida e a dignidade humanas? Tem gente dizendo que a vida é assim mesmo. Que o “bbbb-dose” mostra a realidade. Que realidade mesmo? Como assim? O que deveria ou poderia fazer o Ministério da Educação? Da Cultura? Das Comunicações? A Secretaria Especial dos Direitos Humanos? Nada? O marco legal brasileiro não serve para nada nestas horas? O que fizemos nós nestes quarenta últimos anos? As “discussões”, conversas em todos os lugares, têm servido apenas de propaganda. Quem não assistia agora vai assistir. Não sei se criticamente ou amebamente, já que se trata de um programa para amebas precoces.

Curitiba, 18 de Janeiro de 2012.

João Santiago. Teólogo, Poeta e Militante.

Mestrando em Teologia pela PUCPR.

É autor do Livro “Chuvas de Prata –

Reflexões de um Poeta”. Entre outros.

poesiaemilitancia@yahoo.com.br