João
Ferreira Santiago
Teólogo,
Poeta e Militante. É Educador Popular das Comunidades Eclesiais de Base no
Paraná. Membro da equipe do Talher Nacional de Julho/2005 a Janeiro/2011
Adital
- - 09.08.11 - Brasil
Sessenta anos depois o Brasil será novamente o país sede de uma
copa do mundo de futebol. Digo sessenta anos porque, a copa do mundo já
começou. Mesmo que não tenhamos ouvido o apito inicial, que nossa seleção não
tenha treinado nem pênalti ainda, a bola já rola nos gramados orçamentários. Há
parte significativa da torcida que prepara mudanças nas regras do jogo. É
pênalti contra o time dos patrocinadores, mas à moda do personagem Zeca Diabo
do seriado, "O Bem Amado” de Dias Gomes, ele vai ser cobrado no outro gol.
No gol do time do torcedor, que apesar de ser o maior patrocinador, como
contribuinte, fica no banco de reservas. Às vezes nem isto. Você vai aceitar
ficar no banco de reservas? De 1950 para cá muitas coisas mudaram e muitas
coisas mudaram muito no Brasil. Porém, muitas outras, pouco ou nada mudaram e
temos o dever de não nos permitirmos ser enganados pela maquiagem. O governo e
a nação brasileira trabalharam juntos e bem para garantir que a copa de 2014
fosse aqui. Mas a aquele foi o menor trabalho. Nossa tarefa gigante começa
agora. É não permitir que, mesmo tendo um bom desempenho em campo e sendo
hexacampeão mundial de futebol percamos a copa da participação política por WO.
Temos que entrar em campo e jogar com os dois olhos no bico da chuteira.
Não basta, então, gritarmos, é goool! Temos que antes de
comemorarmos perguntar: gol de quem? Não podemos comemorar quando o gol é
contra. Não podemos também fazer gol contra. Não podemos comemorar a marcação
do pênalti. Só depois que a bola entrar. Temos que combinar antes de tudo, que
gol de mão leve com os recursos públicos não vale. Será anulado e
desclassificará o atleta "espertinho” que tentar tal infração. Temos que
pedalar, driblar a ganância dos investidores e lançar de um lado para o outro a
pergunta: quem ganha e quem perde com isto? Não podemos entrar em campo
perdendo, para a omissão, para a ilusão de que o juiz dará conta de tudo.
Precisamos levantar a bandeira da moralidade, da transparência e da cidadania e
marcar impedimento para os avançadinhos que em nome da copa dizem que tudo está
valendo. É preciso uma marcação cerrada, nada de deixar uma avenida livre no
meio de campo das licitações ou nas laterais do orçamento para a especulação
imobiliária contra-atacar. Vamos botar a bola no chão e cadenciar a partida. Nada
de despejos violentos, nada de tornar o jogo maior que o campeonato. A copa não
é maior que o Brasil. A nossa copa principal é continuar avançando na educação,
na saúde, na segurança pública e na construção dessa nação. A copa não pode não
pode comprometer o futuro do Brasil.
É preciso que fique claro! Quem apita esse jogo é o Ministério
Público! E as regras estão na Constituição Federal brasileira. Nada de mudar as
regras com o jogo andando. A sociedade completará o time da arbitragem. De um
lado as instituições organizadas auxiliarão o ministério público, bandeirando
sempre que algo ameaçar a regra do jogo. Do outro lado a sociedade representada
pelos comitês populares da copa auxiliará, com informações precisas, com dados
reais e sempre com bom senso, e contribuirá também para que nada passe
despercebido. O quarto árbitro será o torcedor, que poderá ser chamado de
cidadão, de patrocinador ou de povo, simplesmente. Com o quarto árbitro ficará
o chip que acusará quando é bola fora e quando é gol legitimo. A suspensão ou a
mudança da regra, alteração da lei será punida como falta gravíssima! Com
pênalti e cartão vermelho! Será mandado para escanteio qualquer tentativa de
desvio de recursos, qualquer casuísmo da CBF ou da FIFA como o estado de
exceção temporária.
Fica assim combinado. O direito à vida, á educação, à moradia, à
segurança, à opinião e à informação, precede o direito à copa. Quem colocar o
direito à copa na frente do direito á vida e dos direitos humanos e sociais
básicos, escritos em nossa constituição, estará impedido de continuar a jogada
e a partida. Será desclassificado. O Brasil continua o país do futebol, mas
também ainda é o país do "jeitinho”, da vantagem e da corrupção. O futebol
brasileiro também tem seu "Ricardão” disposto a levar vantagem em tudo. Certo ? Trazendo
presente outro personagem da televisão, agora da novela Roque Santeiro, onde
"Sinhorzinho” Malta, dizia: "To certo, ou to com a razão?”. Este
autoritarismo como regra e prática não combina com o momento extraordinário que
vive nosso país. Pode alguém ser contra a copa? Claro que pode. Da mesma forma
que pode alguém ser a favor. Porém, a julgar pela reação de apoio popular,
guardado o componente emocional e promocional, feitos com tanta competência, à
época da escolha do Brasil como sede, a esmagadora maioria apóia a copa. Eu
faço parte dessa maioria. Isto não nos impede de ser contra o que querem e
podem alguns fazerem com a copa. Um balcão de negócios pouco ou nada
aceitáveis. Ao contrário nos obriga a ser e dizer que o somos.
O Brasil nos convoca e nos escala para jogar na copa. É hora de
jogar em equipe. Se
cada um e cada uma ocupar a sua posição em campo, souber quando deve avançar e
quando deve recuar. Quando deve segurar e quando deve passar a bola. Se
vestirmos essa camisa com garra e orgulho dela, poderemos ser mais que
hexacampeões mundiais de futebol. Seremos, finalmente cidadãos e cidadãs
capazes de decidir e guiar os destinos de nosso país. Assim, a copa pode ser
mais que um momento esportivo e se transformar em momento de vivência de
cidadania. Em momento pedagógico e político de crescimento.
Curitiba, 07 de Agosto de
2011.